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Tempos de paz

Tempos de paz

meteorologia: calooooorrrrr
pecado da gula: misto quente
teor alcoolico: 2 itaipavas
audio: nerdcast #290
video: criminal minds

Tempos de paz
Direção de Daniel Filho
Roteiro de Bosco Brasil

Filmagem quase literal da peça “Novas Diretrizes em Tempos de Paz”, de Bosco Brasil – responsável pelo roteiro. É basicamente o confronto entre duas pessoas, dois personagens, dois atores. E, por ser esse o trunfo da peça, o elenco foi mantido.

A fim de garantir seu salvo-conduto e o direito de fixar residência no Brasil, o imigrante polonês e refugiado da Segunda Grande Guerra, Clausewitz, vê-se desafiado a fazer chorar um ex-oficial da polícia getulista, Segismundo (Tony Ramos). Este, com o fim da guerra, já não precisa procurar nazistas entre os estrangeiros que chegam ao país. Mas o português quase fluente de Clausewittz, que chega a recitar Drummond, chama a atenção dos agentes da imigração. As mãos lisas – apesar de o passaporte informar que é um agricultor -, a ausência de bagagens e a jovialidade quase excessiva só servem para despertar a desconfiança dos agentes, que acabam por entregá-lo aos “cuidados” do chefe. Já sem muita serventia, Segismundo decide fazer do polonês seu último caso. E faz uma aposta com o suposto agricultor: se ele conseguir fazê-lo chorar, terá permissão de permanecer, senão deverá voltar a seu país de origem – o navio partirá em aproximadamente 10 minutos.

E é a partir daí que o filme ganha corpo e presença. E foi o que me fez continuar assistindo, já que não fazia a menor ideia do que se tratava o filme ao começar a assisti-lo. Até então, só conseguia pensar que estava assistindo a uma versão brazuca de “O terminal”. A semelhança física de Stulbach com Tom Hanks corroborando ainda mais para essa impressão. Mas felizmente, o filme é muito mais que isso. A direção contida e sem exageros de Daniel Filho faz-nos esquecer da linguagem televisiva que ele usou e abusou em “Se eu fosse você” (1 e 2). Mas o maior mérito mesmo é da dupla central de atores, Tony Ramos e Dan Stulbach.

Apesar de ser o monólogo impressionante de Clausewitz (Dan Stulbach) o responsável pelo filme ser algo mais que uma mera produção global, é uma grata surpresa ver Tony Ramos atuando de verdade – e não no piloto automático como ao personificar Cláudio de “Se eu fosse você”. A frieza com que seu personagem conta as atrocidades praticadas durante sua passagem pela polícia, quando atuava como torturador, é de virar o estômago. Discorre sobre as técnicas utilizadas como se estivesse dando uma receita de bolo. E neste ponto, o espectador se pergunta: Como fazer chorar alguém que fala de tortura de modo tão natural? Como emocionar alguém que é tão alheio ao sofrimento de outro ser humano? E percebe-se a mesma dúvida estampada no rosto de Clausewitz.

É um elogio ao teatro. Uma consagração da arte como força transformadora.
Vale assistir.

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